Os verdadeiros terapeutas têm a capacidade de ouvir com todo o seu ser, sem preconceitos, sem julgamentos
Trecho do livro “Raiva – Sabedoria para Abrandar as Chamas”, de autoria do monge budista vietnamita Thich Nhat Hanh, 1926-2022 (que eu leio atualmente e tenho o prazer de compartilhar).
Tom Simões, jornalista, Santos (Brasil), 2 de julho de 2025
“Eu não sei como os terapeutas são treinados para
adquirir a capacidade de ouvir dessa forma. Um terapeuta pode também estar
cheio de sofrimento. Enquanto senta e ouve o cliente, as sementes de sofrimento
nele podem ser regadas. Se o terapeuta estiver dominado pelo próprio
sofrimento, como poderá escutar a outra pessoa de maneira adequada? Quando você
é treinado para se tornar um terapeuta, deve aprender a arte da escuta
profunda.
Ouvir com empatia significa que você escuta de um modo tal que a outra pessoa sente que você está realmente a escutando, realmente a compreendendo e a ouvindo com todo o seu ser – com o seu coração. Mas quantos de nós somos capazes de ouvir o outro dessa forma?
Nós concordamos teoricamente que devemos ouvir com o
coração, para conseguir realmente ouvir o que o outro está falando. Concordamos
que devemos transmitir a quem fala a sensação de estar sendo ouvido e
compreendido. Somente isso pode proporcionar alívio a essa pessoa. Mas, na
verdade, quantos de nós somos capazes de ouvir dessa forma?
Escutar para aliviar
Escuta profunda, escuta compassiva não significa
ouvir com o propósito de analisar ou de, nem mesmo, descobrir o que aconteceu
no passado. Você ouve, acima de tudo, para ajudar o outro, dando-lhe
oportunidade de falar livremente, e sentir que finalmente alguém o compreende.
Escutar profundamente é o tipo de escuta que nos ajuda a manter a compaixão
viva enquanto o outro fala, por um período de trinta a quarenta e cinco
minutos. Durante esse tempo, você só tem em mente um objetivo, um desejo: ouvir
o outro para lhe dar a oportunidade de falar livremente e sofrer menos. É este
o seu único propósito. Outros propósitos, de analisar e compreender o passado,
podem ser um subproduto desse trabalho. MAS, ACIMA DE TUDO, ESCUTE COM
COMPAIXÃO.
Só compaixão
pode lhe impedir de ficar irritado. Com boa disposição, o retorno vem, sempre,
lá do alto
Compaixão é o antídoto da raiva e amargura. Se
mantiver viva sua compaixão enquanto você ouve o outro, a raiva e irritação não
vão conseguir brotar. Caso contrário, coisas que a pessoa disser vão
desencadear irritação, raiva e sofrimento em você. Só compaixão pode lhe
impedir de ficar irritado, furioso ou desesperado.
Então você quer agir como um Grande Ser
enquanto ouve, pois compreende que a outra pessoa sofre muito e precisa que alguém
intervenha e a resgate. Mas você tem que estar equipado com algo para realizar
o trabalho.
Quando os bombeiros chegam para ajudar a extinguir um
incêndio, eles precisam do equipamento certo. Devem ter escadas, água e o tipo
de roupa que os protegem do fogo. Devem conhecer muitas formas de se protegerem
e de extinguir o fogo. Ao ouvir profundamente alguém que está sofrendo, você
entra numa zona de incêndio. O fogo do sofrimento, da raiva estão queimando
naquela pessoa que você ouve. Se não estiver equipado, não conseguirá ajudar e
poderá se tornar vítima do fogo. Por isso você precisa do equipamento.
O seu equipamento aqui é a compaixão, que pode ser
nutrida e mantida viva com a prática de respirar atentamente. Respirando
atentamente você gera a energia da atenção consciente. Respirar atentamente
mantém vivo o seu desejo fundamental de ajudar o outro a se exprimir com
franqueza. Quando a outra pessoa fala, suas palavras podem estar cheias de
amargura, condenação e julgamento. Essas palavras podem desencadear sofrimento
em você. Mas se a compaixão se mantiver viva, através da prática de respirar
atentamente, você está protegido. Você será capaz de se sentar e escutar
durante uma hora sem sofrimento.
Desempenhe o
papel de um bodisatva (*). Você
será o melhor tipo de terapeuta
Quando você não tem a capacidade de ouvir compassivamente, não pode simplesmente fingir estar ouvindo. A outra pessoa perceberá que você está cheio de ideias sobre sofrimento, mas na realidade não a compreende.”
***
(*) Em termos bem simples, um bodisatva é uma pessoa sábia e compassiva que valoriza e aprecia todos os demais seres. Claro, existem muitas pessoas inteligentes e bondosas por aí, então o que torna um bodisatva diferente? Para começar, bodisatvas não apenas desejam o bem dos outros seres como também conhecem alguns métodos habilidosos que podem efetivamente ajudá-los a acabar com seu sofrimento. Além disso, bodisatvas trabalham incansavelmente para de fato ajudar todos os seres. É esse conhecimento e objetivo que tornam a compaixão de um bodisatva tão poderosa.
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