sábado, 4 de outubro de 2008

Terapia pelos livros

Pedro Dias Leite, de Londres, Folha de S.Paulo (caderno Mais!), 28 de setembro de 2008

“Talvez você fique duas horas no trânsito para ir a um trabalho que odeia. Talvez você tenha filhos pequenos e só sobrem cinco minutos de vez em quando para ler. Talvez você esteja para embarcar em uma viagem de três semanas para a Amazônia e busque um livro que fale de tudo sobre o destino. Tudo o que o aflige e tudo o que o encanta. Nós vamos encontrar a receita de leitura certa para você".


É assim que a School of Life (literalmente, Escola da Vida) define a "biblioterapia", projeto lançado no início deste mês em Londres.

A idéia é a seguinte: o cliente preenche uma ficha com informações sobre sua história, suas aspirações e seus hábitos e, a partir de uma consulta com um especialista, recebe indicações de leitura que o ajude a enfrentar uma nova fase, encarar uma etapa importante ou simplesmente aproveitar um momento da vida.

Como você descreveria seus hábitos de leitura? Quando você lê, e onde? Você termina o que você começa a ler? O que está lhe preocupando? Onde você se imagina daqui a dez anos? Quais são suas paixões?

Essas são algumas das perguntas do questionário, que é preenchido e repassado a um dos especialistas, que vai analisá-lo e fazer uma entrevista com o cliente.

35 a sessão

Uma sessão custa 35 (R$ 120), mas pode-se escolher um contrato de cinco meses, em que o biblioanalista acompanha suas leituras e troca informações por e-mail, por 50 (R$ 170). "As pessoas muitas vezes nem sabem o que estão procurando, estão perdidas. O objetivo não é impor uma leitura, mas encontrar algo que tenha a ver com o momento e os anseios", diz Harriet Warden, a gerente-geral da loja.

O estabelecimento abriu há três semanas e, desde então, cerca de 30 pessoas já procuraram as sessões de biblioterapia. "Um casal planejava fazer uma viagem e procurava obras que ao mesmo tempo transmitissem o clima do lugar e dessem uma idéia não ficcional do que iriam encontrar. Nosso consultor sugeriu alguns livros... Vamos ver quando voltarem", afirma Warden, detrás do pequeno balcão da pequena loja, perto da estação de metrô de Russel Square.

A Escola da Vida se define como uma "pequena loja com enormes ambições". As prateleiras têm menos de cem livros, mas numa divisão especial.

O tom de auto-ajuda da loja é atenuado pelos nomes por trás da empreitada. Entre os sócios da "Escola da Vida", estão o filósofo Alain de Botton, que ficou famoso com o livro "Como Proust Pode Mudar Sua Vida" (Rocco), o escritor Robert Macfarlane, professor na Universidade de Cambridge e ganhador de vários prêmios literários, e o também escritor Geoff Dyer.

"Esse é o tipo de lugar que pode te tornar genuinamente sábio, em vez de apenas esperto. É tudo o que eu tenho tentado fazer com a minha escrita nos últimos 15 anos", diz De Botton no site da loja.

Cursos

Além da biblioterapia, a escola também oferece uma série de cursos, nos moldes dos que a Casa do Saber oferece no Brasil. São "cursos pequenos sobre as grandes questões da vida": diversão, família, trabalho, política e amor.

"Algumas pessoas jamais teriam se apaixonado se elas não tivessem ouvido falar disso" é a frase de La Rochefoucauld (1613-80) escolhida para o panfleto do curso sobre o amor, que começa com o "Banquete", de Platão, para explicar por que as pessoas precisam de um relacionamento; passa pelas visões de vários filósofos sobre sexo e termina tentando responder à pergunta sobre como fazer o amor durar.

Os cursos custam 195 (R$ 665) e são um dos principais objetivos da escola. Na tarde de quinta-feira, quando da visita à loja, na hora do almoço, cerca de 15 pessoas chegavam para uma palestra que iria durar até o final da tarde.

Em busca de aventura

O objetivo é encontrar um público "em busca de aventura pessoal e intelectual, com curiosidade, mente aberta e um apetite pela vida”.

Em tempos em que um livro é publicado a cada 30 segundos e seriam necessárias 163 vidas para ler todos os livros oferecidos pela Amazon (como bem lembra o site da escola), as sessões de biblioterapia podem ser um bom guia para quem está perdido.

Mas é sempre bom lembrar a frase de Virginia Woolf em "Como Ler um Livro", de 1926: "O único conselho que alguém pode dar sobre a leitura é: não aceite nenhum conselho”.

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