sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Autossabotagem

É tempo de mudar, se rever, se encorajar e seguir adiante..., no rumo de uma nova pessoa, disposta a parar de culpar o outro pelas insatisfações com a vida. “Porque mudança também significa revolução”, diz o psicólogo Stanley Rosner, autor da interessante obra “O ciclo da autossabotagem”.

No livro, Rosner, com a ajuda da escritora Patrícia Hermes, discorre sobre casos reais, vividos em seu consultório, que mostram como episódios da infância podem criar dilemas inconscientes que nos levam a agir contra nós mesmos. Ele descreve como reconhecer esses comportamentos e superá-los.


“O que motiva as pessoas a repetir um comportamento que vai contra sua felicidade, satisfação, sobrevivência e outras metas sensatas? Raramente reconhecemos os fundamentos profundamente arraigados de nossas repetições, sem falar nas etapas emocionais necessárias para mudá-las”, escreve o psicólogo.

Segundo o autor, a terapia psicanalítica intensiva é a abordagem atualmente disponível para lidar com a autossabotagem. Isto exige um compromisso em longo prazo e sessões frequentes, que são essenciais para chegar às questões principais, trabalhar com as defesas bastante arraigadas e elaborá-las. Este tipo de trabalho intensivo, revela Rosner, não é popular hoje por muitas razões. Mas é um passo em direção ao tipo de exame de consciência necessário para romper tais ciclos e ajudar o indivíduo. “É um passo necessário para aprender que a vida é cheia de escolhas, e que nossas escolhas não precisam estar baseadas na repetição eterna dos mesmos equívocos”.


A culpa é do outro...


Para Rosner, vivemos numa sociedade que tende a julgar e a criticar. “O pensamento e o comportamento são taxados de bons ou maus, certos ou errados, pretos ou brancos. Este tipo de raciocínio é a antítese da procura do significado. Despreza o fato de que pode haver uma explicação para pensamentos e comportamentos que não seja provida de julgamento nem de críticas”.


Não há pecadores na terapia, admite o psicólogo. “Ela pode ser uma experiência bastante tranquila e libertadora. Depois do reconhecimento e da conscientização, vem o trabalho da consternação – consternação porque injustiças foram cometidas, consternação porque não havia ninguém para ouvir quando o indivíduo precisava ser ouvido, consternação pela perda de oportunidades de crescimento e de mudanças. A consternação e o despojamento são realmente difíceis. Contudo, a consternação é essencial para solucionar padrões de autossabotagem. E muitos indivíduos presos em uma compulsão à repetição são incapazes de se consternar”.


Rosner diz que é difícil encarar que sou eu que procuro a agressão, que sou eu que boicoto meus relacionamentos, que sou eu o responsável pelas dificuldades que continuo enfrentando com chefes, cônjuges e com os filhos. Esse “pertencimento” significa assumir a responsabilidade pela situação em que a pessoa se encontra.


“Os parceiros podem mudar no casamento; podem e, de fato, crescem em direções diferentes. Um dos dois pode querer manter as coisas como estão, enquanto o outro pode querer seguir adiante. Mas eles serão obrigados a reconhecer que não podem culpar o outro por tudo. Às vezes, a tendência é acumular injustiças, remoer pensamentos de vingança, conviver com eles e usá-los como parte de uma luta de poder, para se manter na posição dominante e deixar o outro na posição de subserviência. Isto é o oposto de agir responsavelmente, tomando por base o reconhecimento de que o indivíduo tem alternativas e escolhas, que fazer com os outros o que fizeram com ele perpetua os problemas. Eles podem manter a relação e tentar seguir em frente, ou podem terminar o relacionamento. Qualquer que seja a escolha, é com ela que eles terão de conviver”, observa Rosner.

É tempo de repensar...


Além de sintonizar com sua vida interior, formada por pensamentos e emoções fugazes, o psicólogo assinala que pode ser de grande utilidade começar a prestar atenção ao modo das pessoas reagirem à nossa presença. “As pessoas movem-se cuidadosamente ao seu redor? Você inspira medo? Ou elas ficam calorosas e despreocupadas em sua presença? Seus filhos são muito cautelosos com você? E quanto às pessoas com as quais você entra em contato eventualmente? Esses encontros podem, às vezes, ser ainda mais reveladores do que aqueles que acontecem no seio familiar. Você acha os lojistas amigáveis e receptivos? As pessoas sorriem para você, cumprimentam-lhe calorosamente quando você entra no mesmo estabelecimento toda manhã para tomar café? Ou elas lhe respondem com reservas? E quanto às suas respostas aos outros? Você faz amizade em todo lugar...? Os indivíduos lhe correspondem ou eles ficam tímidos? Qual é a mensagem que você está enviando?”


Com base nessas questões, Rosner orienta que pode ser de grande valia gastar alguns minutos do dia fazendo um exame minucioso de sua saúde mental. “Arrume um tempo e se sente calmamente, de preferência quando não houver ninguém a sua volta, em uma sala, sozinho”. Para ele, é mais fácil seguir em frente, apesar das consequências reais, do que mergulhar na causa das tensões, frustrações e decepções.


“Quanto mais o indivíduo representa, menos provável que ele se observe. Então, nos defendemos reprimindo as memórias e os sentimentos que as acompanham. Desse modo, acreditamos que os esquecemos. Mas não conseguimos, pois tais sentimentos deflagram a raiva e desejos de vingança, ou depressão e pensamentos distorcidos”, relata.


Outra coisa bastante útil que você pode fazer, conforme sugere o psicólogo, é manter uma espécie de balanço do que está acontecendo em sua vida íntima, fazendo anotações. Para ele, reler essas notas, ver o mesmo assunto, algumas palavras, dia após dia, diz-nos alguma coisa. 


E, prossegue Stanley Rosner, se alguém se sentir inclinado a optar pela terapia, haverá uma quantidade suficiente de informações já extraídas de seu inconsciente, que o ajudarão a progredir mais rapidamente nas sessões de psicoterapia.

Ler, como recurso para autoconhecimento


O psicólogo orienta que há uma grande variedade de livros de autoajuda no mercado, que, realmente, oferecem algum insight sobre o que está acontecendo internamente e sugestões de como obter ajuda. “Alguns desses livros são muito bons; outros, nem tanto. Mas vá a uma livraria e folheie alguns. Muitos deles propõem soluções simplistas que nada acrescentam. Mas há os que podem provocar reflexões sobre como mudar de vida”. 


A esta altura, comenta Rosner, já se sabe que é preciso muito mais do que conscientização para mudar padrões repetitivos. Às vezes, a pessoa não está ciente do que está fazendo. A conscientização adquirida pela leitura pode ajudar a pessoa a dar os próximos passos. 


Concordo com Rosner, psicólogo clínico com experiência em atendimento individual há mais de 40 anos. Por experiência própria, acredito que livros sobre filosofia e psicologia, principalmente, quando adequados, podem proporcionar mudanças pessoais significativas na vida, desde que o indivíduo reconheça os seus limites e se esforce, continuamente, para superá-los. Necessariamente, tem de haver disposição para a mudança, para o indivíduo aprimorar comportamentos a cada novo dia. É fundamental não perder o controle durante a trajetória da construção do novo “eu”, principalmente no início do processo da conscientização, com a prática permanente de exercícios de superação. 

Desperto logo cedo com novos propósitos construtivos e, ao me recolher à noite, tenho o hábito de avaliar onde errei, onde cresci..., e assim vou me transformando, buscando tornar-me melhor a cada novo dia.    


Em sua obra “Quem me roubou de mim”, Fábio de Melo escreve: “O mundo começa na palavra que pronunciamos. A próxima palavra a ser proferida é sempre a nova oportunidade que recebemos de mudar a história. Palavras possuem o poder de mover as estruturas. Por meio delas vivemos o processo de ‘metanoia’, palavra de origem grega que significa “mudança de mentalidade”.
Mudar de mentalidade, segundo Fábio, é assumir um novo jeito de interpretar os fatos, as pessoas e o mundo. Por isso as palavras são ditas, são escritas. Para que tenham o poder de transformar as mentalidades. “Cada vez que realizamos um gesto que organiza, que coloca na ordem e que harmoniza, de alguma forma estamos recriando o mundo, isto é, estamos desfazendo o caos”, complementa.

Há livros e livros. Obras como “O ciclo da autossabotagem” e “Quem me roubou de mim”, por exemplo, são recheados com alguns fundamentos da psicologia, através dos quais certamente nos identificamos. Creio que a leitura de obras do gênero pode acelerar etapas que levam ao aprimoramento pessoal. 

Que bom quando somos capazes de fazer amigos íntimos, aos quais fazemos revelações pessoais, numa espécie de terapia psicanalítica, e compartilhamos  conhecimentos de filosofia e psicologia apreendidos de leituras.


Para finalizar, ocorre-me algo da letra de “O que você faria”, de Paulinho Moska: “O que você faria se só lhe restasse esse dia!” Que tal começar a se tornar algo diferente do que era, a partir de agora? E então avaliar sensíveis mudanças, ao longo de uma semana e assim sucessivamente. Não custa experimentar. Pequenos avanços conscientes estimulam o processo da superação de hábitos prejudiciais.


E, para sintetizar Stanley Rosner: arrume um tempo e se sente calmamente, fazendo uma espécie de balanço do que ora acontece em sua vida íntima, fazendo anotações... Porque a disposição para a mudança é indispensável para lidar com a autossabotagem, que nos leva a agir contra nós mesmos.

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