quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

ASSERTIVIDADE NA RELAÇÃO A DOIS

“A assertividade envolve a habilidade de expressar adequadamente nossos desejos e sentimentos sem ferir os direitos do outro”

ACABO DE LER “Falo? ou não falo?” (expressando sentimentos e comunicando ideias), editado pelas psicólogas Fatima Cristina de Souza Conte e Maria Zilah da Silva Brandão, uma obra que reúne vários autores, todos psicólogos.

A terapeuta de minha filha indicou-lhe esse livro. Ela começou a lê-lo e o deixou de lado, provisoriamente, interessada em outra obra. Foi quando me emprestou. Ao concluir a leitura, eu disse que ela não poderia deixar de ler o livro. E que começasse pela página 71: “Saber falar e saber ouvir: a comunicação entre casais”.

Falo...” trata de algo, a meu ver, indispensável, para o relacionamento a dois e a educação de filhos. Conforme consta da apresentação, uma das estratégias de apoio do terapeuta é a “biblioterapia”, conjunto de textos informativos, em linguagem acessível, destinados a intensificar, fortalecer, tornar explícito; enfim, ajudar na realização de um processo psicoterápico eficiente.

Relação conjugal ideal” é um dos artigos mais lidos deste blog. Pessoas interessadas em mudar suas relações afetivas e sociais têm mesmo é que despertar para a leitura, independentemente de buscar a superação pessoal em outras fontes. Há de haver vontade e coragem de mudar. Uma leitura útil pode cumprir a função de despertá-lo das velhas formas repetitivas e condicionadas de pensar.

Se desejarmos realmente mudar nossas vidas, precisamos começar neste momento. Boas leituras podem levar o leitor para um estágio melhor do que o anterior.

CASAMENTO

Imagem: www.bokelberg.com
“O casamento não se compõe apenas de uma comunhão espiritual e de abraços apaixonados; compõe-se também de três refeições por dia, lavar a louça e lembrar de por o lixo pra fora” (Joyce Brothers, conforme citado por Ruy Castro). Quem escreve sobre isto em “Falo? ou não falo?” são as psicólogas Vera Regina Lignelli Otero e Fabiana Guerrelhas.

Vera Regina e Fabiana citam novamente Ruy Castro: “A tragédia do casamento é que enquanto todas as mulheres se casam pensando que seu homem irá mudar, todos os homens se casam pensando que sua mulher nunca mudará. Ambos invariavelmente se desapontam” (Lei Deighton).

Antes da união, cada um tinha mais independência e liberdade para administrar sozinho sua vida. Para as autoras, após o casamento, muitas coisas precisam ser compartilhadas: horários, decisões, espaços, hábitos, preferências e interesses pessoais, dentre outras. Tudo isso envolve conversa, tudo isso envolve negociação. A arte de negociar é uma habilidade verbal que precisa fazer parte do repertório de interações dos casais, é uma arte aprendida.

Para as especialistas, os problemas vividos por um casal, na maioria das vezes, são desencadeados pelas dificuldades inerentes à qualidade de comunicação que eles têm. “Estes problemas podem ocorrer mesmo quando os casais vivem bem, se eles não souberem conversar de uma maneira gostosa e produtiva. Se não sabem falar e não sabem ouvir, eles não sabem ser assertivos. Ser assertivo é saber dizer o que se quer, respeitando a si e ao outro. Assertividade requer que se ouça com atenção e respeito quando é a vez do outro falar, que se saiba conversar!”

A assertividade, revelam as profissionais, envolve a habilidade de expressar adequadamente nossos desejos e sentimentos sem ferir os direitos do outro. “Parece que a intimidade própria do casamento faz com que a assertividade seja praticada de maneira incompleta. Às vezes, os desejos e sentimentos são expressos, mas sem que haja o respeito pelos direitos do outro. Em alguns casos, pelo medo de que a união (que pressupunham ser eterna) se desfaça, os desejos e sentimentos não são expressos e só o direito do outro é que conta”.


“VOCÊ CRÊ QUE SERIA CAPAZ DE CONVERSAR COM PRAZER COM ESTA PESSOA ATÉ A SUA VELHICE?”
Cordova, J.V. e Jacobson, N.S. (1999), em sua obra “Crises de casais”, citados em “Falo...” nos ensinam que “a comunicação insatisfatória e as desavenças muitas vezes levam duas pessoas que podem se amar profundamente a produzir, uma na outra, mais sofrimento do que alegria”.

Segundo as psicólogas Vera Regina Otero e Fabiana Guerrelhas, ao contrário do que se imagina, as características de uma pessoa são adquiridas e não inatas. “Nossas habilidades sociais foram “moldadas” pelas nossas vivências desde que nascemos. Elas contêm elementos do que presenciamos em nossas famílias de origem, do que lemos nos livros, vimos nos cinemas e nos teatros; do que nos ensinaram nas igrejas, nas escolas  ou em quaisquer outros contextos”.

Isso pode ser exemplificado com o caso de uma cliente que buscou terapia por sentir dores insuportáveis por todo o corpo, que não apresentavam nenhuma causa física identificável, explicam as autoras. Era uma mulher de 33 anos, de origem asiática, “convictamente” religiosa, que se calava “deliberadamente” quando o marido a magoava com seu jeito agressivo de criticá-la. Essa senhora, prosseguem as psicólogas, demorou um bom tempo para identificar (e aceitar) que suas dores eram suas manifestações de desagrado, de injustiça, de mágoa, de sofrimento, causadas pela maneira como aceitava conduzir sua vida.

Vera Regina e Fabiana lembram Rubem Alves, citando Nietzsche, que afirma: “Ao pensar sobre a possibilidade do casamento, cada um deveria se fazer a seguinte pergunta: “Você crê que seria capaz de conversar com prazer com esta pessoa até a sua velhice? Tudo o mais no casamento é transitório, mas as relações que desafiam o tempo são aquelas construídas sobre a arte de conversar”. E finalmente diz Rubem: “Então, por favor, me ouça! E se você quiser falar, espere alguns minutos até a sua vez. E eu prometo escutá-lo”.

Yara Kuperstein Ingberman e Suzane Schmidlin Löhr, em outro capítulo de “Falo...”, partem do pressuposto de que o homem é um ser em construção contínua, com capacidade de desaprender hábitos disfuncionais e desenvolver maneiras mais apropriadas de lidar com as situações no curso de sua vida. De acordo com esta visão, é possível, em diversas etapas da vida, aprender a lidar com as relações interpessoais de forma mais produtiva.

De acordo essas duas psicólogas, manejo social apropriado envolve equilíbrio entre direitos e limites, o que conduz a outro termo, empatia. “Ser empático é saber colocar-se no lugar do outro, conseguir avaliar como o outro pode estar se sentindo nesta situação específica e responder a esta percepção com compreensão e apoio.”
 
FALA DESNECESSÁRIA

Em sua obra “Dharma, o caminho da libertação”, Joseph Goldstein diz: “Veja se consegue notar a intenção da fala antes que as palavras cheguem a ser pronunciadas. Exatamente nesse momento, você poderá colocar em prática a sabedoria do discurso hábil e escolher apropriadamente se dará voz ou não a determinado pensamento em particular. “Talvez você logo descubra que passou a apreciar períodos maiores de silêncio. Embora, de início, isso possa parecer um exercício desajeitado, com a prática nossa percepção de todos os tipos de intenções se torna parte natural da nossa vida meditativa, com imensos resultados para nossa felicidade e bem-estar. Alertas e relaxados, não procuramos nenhuma experiência em particular; estamos simplesmente despertos para o que se apresenta. Observar dessa maneira abre mundos que talvez jamais notaríamos”.

Para esse autor, quando não temos consciência, simplesmente agimos a partir dos muitos hábitos do nosso condicionamento. Quando temos consciência, os mesmos impulsos habituais podem surgir, mas então temos a escolha de agir ou não.
 
FILHOS À VISTA: PRESTE BEM ATENÇÃO EM TUDO ISTO

“As verdades nem sempre coincidem e não é possível enxergar toda a verdade. Na assertividade, isso implica que, para o respeito ser recíproco, a criança, por exemplo, terá de aceitar que o outro possa pensar e sentir diferentemente dela, e os interesses possam conflitar. Serão precisos acordos e concessões, de um lado e de outro, mas não a ponto de comprometer a integridade de cada um. Muitas vezes será preciso ceder para que as necessidades dos dois sejam, pelo menos, parcialmente satisfeitas. Cada um perderá um pouco para ganhar algo maior, por exemplo, amigos para brincar junto e relacionamentos mais agradáveis.” Quem fala sobre isto são as psicólogas Fátima Cristina de Souza Conte e Jaíde Aparecida Gomes Regra, que também integram “Falo...”.

Para Laércia Abreu Vasconcelos, outra autora dessa obra, o bombardeamento de informações que sofremos no século XXI cria a necessidade de formarmos indivíduos que saibam questionar, criticar e selecionar essas informações. Ela cita a jornalista e produtora cultural Silvana Gontijo, que tem discutido a criação de uma disciplina nas escolas voltada para o ensino de uma visão crítica das informações veiculadas pelos jornais, revistas, rádio e televisão. Para a jornalista, a criança de nosso tempo nasce e se desenvolve de forma distinta das crianças de algumas décadas atrás. Ontem, nascíamos de olhinhos fechados, ficávamos em quartos escuros... Hoje, a criança nasce de olhos bem abertos, observando tudo ao seu redor.

“A vida nos oferece muitas chances de conversa. Conversas com pessoas íntimas ou com estranhos. Conversas com finalidades específicas ou apenas para passar o tempo. Mas em qualquer uma delas podem-se combinar elementos que nos interessam muito. Algumas perguntas ajudam a analisar uma conversa. Sinto-me vulnerável? Meu amor próprio está em jogo? O assunto é importante? Se a resposta é sim a uma ou mais dessas perguntas, certamente você está a meio caminho de se envolver em uma conversa difícil.”, revela a psicóloga Maria Júlia Ferreira Xavier Ribeiro, outra integrante do livro.

Para os psicólogos Zilda Aparecida Pereira Del Prette e Almir Del Prette,  também presentes na obra, quando o homem pretende entender o sentido da existência ou se interroga na observação que faz do universo, ele se coloca no campo da experiência filosófica e religiosa. Não importa se suas questões nascem da perspectiva de algum credo ou independente de qualquer identificação com alguma igreja: a sua experiência é uma experiência com o sagrado e envolve o pensar, o sentir e o agir. É no campo do sentir que sua experiência se aprofunda em uma mistura de temor, espanto e fascínio.

Ao finalizar esta reflexão, inspiro-me em Luc Ferry, filósofo francês, em “Aprender a viver, filosofia para os novos tempos”: “Se nos deixamos prender pouco a pouco na armadilha dos apegos que o amor sempre nos prepara, predispomo-nos aos piores sofrimentos, já que a vida é mudança, impermanência, e todos os seres são perecíveis. E mais ainda. Não é apenas da felicidade, da serenidade que nos privamos antecipadamente, mas da liberdade”.

Revisão do texto: Márcia Navarro Cipólli, navarro98@gmail.com

2 comentários:

  1. Antônio Carlos, há tempos te devia uma visita neste espaço. Textos excelentes! Sobre este último, confesso que me esforço todos os dias para escutar mais. Falar é uma tentação quase incontrolável!! E escutar é parte fundamental no diálogo como pacto. Depois de bater cabeça e machucar o peito, agarrei-me à bandeira do diálogo. Um grande abraço!!!

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  2. Tom!! O seu blog é muito bom! Pq vc não publica um livro? Tenho certeza que será um sucesso! Bjos

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