sexta-feira, 3 de julho de 2009

Jornalistas: cai exigência do diploma

Estudantes de Jornalismo estão bastante apreensivos. Eles temem, por exemplo,  que a não obrigatoriedade do diploma do curso possa aumentar o número de interessados em atuar na área e, consequentemente, a concorrência. Mas, certamente, os estudantes não precisam se preocupar, pois a maior parte da mídia continuará exigindo profissionais graduados na especialidade. No dia 17 de junho, William Bonner encerrou o “Jornal Nacional” declarando que a Rede Globo de Televisão não abrirá mão do diploma de Jornalismo de seus novos jornalistas.

Por outro lado, a medida favorecerá profissionais de outras áreas do conhecimento que escrevem para veículos de comunicação. É claro que, para escrever, é preciso capacidade inata ou adquirida. Não é qualquer profissional, por mais competente que seja em sua profissão, que consegue transmitir jornalisticamente, com clareza e capacidade de síntese, as suas ideias. Quem dispõe de um talento dessa natureza, um economista, por exemplo, pode até pensar em se aperfeiçoar em redação jornalística, até mesmo cursando um mestrado ou doutorado, como, certamente, já vem ocorrendo.

Vale falar ainda sobre a infinidade de veículos de comunicação regionais (jornais, folhetos...) que continuarão a ser produzidos, até por pessoas sem nível superior, como já ocorria antes da aplicação da nova medida.


Portanto, estudantes de Jornalismo, talento e conhecimento não dependerão da exigência ou não do diploma. O que é mesmo necessário é investir na formação educacional adequada e em um bom currículo profissional, pré-condições fundamentais para a colocação e o progresso do jornalista no mercado de trabalho.


Cai a obrigatoriedade


“O Supremo Tribunal Federal derrubou ontem (17 de junho de 2009) a obrigatoriedade do diploma de Jornalismo para o exercício da profissão. O STF julgou que o decreto-lei 972 de 1969, que exige o documento, é incompatível com a Constituição de 1988, que garante a liberdade de expressão e de comunicação”, escreve Felipe Seligman no artigo “STF revoga a exigência de diploma para jornalismo” (Folha de S.Paulo de 18/6/2009). 


Segundo Seligman, o presidente do Supremo, ministro Gilmar Mendes, disse que o Estado não pode regulamentar a profissão de jornalista, mas que isso não inviabiliza os cursos de Jornalismo, já que órgãos de imprensa podem cobrar o diploma, se entenderem ser necessário. Ricardo Lewandowski, citado no referido artigo, disse que o jornalismo prescinde de diploma, requerendo desses profissionais uma sólida cultura, domínio do idioma, formação ética e fidelidade aos fatos.  


Felipe Seligman lembra que a Folha sempre criticou a exigência do diploma. No editorial “Imprensa no STF”, de abril deste ano, o jornal sustentou a posição de que “a obrigatoriedade do diploma afronta a liberdade de expressão, diminui a oferta de informação de qualidade e se reveste de anacronismo na era da internet”.


“Faculdades de Jornalismo sempre tiveram uma contribuição a dar para a prática da profissão. Trata-se, mais que nunca, de confiar na melhoria de seus padrões de ensino e no aporte seja de técnicas específicas, seja de uma formação humanística geral, que podem trazer ao interessado na carreira de jornalista”, registra o editorial “Um jornalismo melhor” da Folha de 19 de junho. Conforme esse editorial, o que nunca se justificou – e vai se revelando cada vez mais anacrônico diante da proliferação do jornalismo pela internet – é restringir aos detentores de diploma específico uma atividade que só se beneficia quando profissionais de outras áreas – médicos, filósofos, historiadores, biólogos – encontram lugar nas redações.


“Mente sintetizadora”


De todos os artigos que li sobre o assunto, achei especial o de Gilberto Dimenstein:  “Jornalista sem diploma não tem futuro”, Folha de 21 de junho. 


Dimenstein comenta que o psicólogo Howard Gardner, professor de Harvard, afirma que uma das habilidades fundamentais no mercado de trabalho é a “mente sintetizadora”. Por isso, apesar da decisão do Supremo Tribunal Federal de permitir que até um jovem com ensino médio (ou menos) trabalhe numa Redação, o jornalista não terá futuro sem, no mínimo, um diploma. 


Dimenstein relata que mente sintetizadora é a que tem habilidade de extrair o que é essencial do amontoado cada vez maior de informações despejadas diariamente pelos mais diferentes meios. Para o psicólogo Gardner, o profissional do futuro deverá ter essa “mente” ou, então, ser assessorado por alguém que a tenha, do contrário, tende a ficar paralisado entre as múltiplas alternativas, conta Gilberto.

“Para nenhum profissional, o desafio de lidar com o excesso de informação (e, portanto, exercer a capacidade de síntese) é tão pesado como para os jornalistas. Afinal, a imprensa é e será o grande filtro, seja no papel, no rádio, nas telas da televisão ou do computador”, observa Dimenstein.


Mas as reflexões de Dimenstein não param por aí. Ele acrescenta que “o jornal ‘The New York Times’ inventou, no mês passado, um novo cargo: editora de ‘mídia social’. Sua missão: navegar pelo labirinto das redes de internet como Orkut, Facebook, Twitter, além da floresta de blogs, e descobrir informações e tendências”.


Mais Gilberto Dimenstein...


Impossível sintetizar a crônica dele. É tudo tão especial que fica difícil! 


Então resolvo citar seguidamente várias de suas reflexões:


“... Não se desenvolve a capacidade de síntese sem um longo treino de associação de dados, ideias e conceitos, o que exige uma vivência de ensino superior, com cargas de leitura e dissertações aprofundadas. Desenvolve-se, aí, a competência para identificar, relacionar e selecionar, a partir de problemas complexos.


... O fim da obrigatoriedade do diploma responde a essa demanda dos meios de comunicação: a abertura para profissionais ou acadêmicos das mais diversas áreas, especializados em determinados assuntos, capazes de acompanhar melhor a velocidade do conhecimento.


... É bem diferente de certos tempos em que se aceitavam, sem maiores problemas, repórteres talentosos para descobrir o futuro, mas incapazes de escrever; havia, na Redação, profissionais pagos para escrever a matéria, chamados ‘copidesque’.


... O jornalista de qualidade será obrigado a se reciclar permanentemente, mantendo-se ligado a algum nível de vida acadêmica. É apenas consequência óbvia da era da aprendizagem permanente. Ou seja, um diploma é pouco.


... O presidente do STF, ao justificar o fim do diploma, comparou o jornalista ao cozinheiro. Também não acredito que um cozinheiro, no futuro, prospere sem diploma de ensino superior.

... Os profissionais que desejarem prosperar numa Redação terão de reciclar sua linguagem e lidar com as técnicas de comunicação; o acadêmico tem a reverência do processo; o comunicador, a do instante.


... Minha aposta é que serão criados cursos de curta duração, no estilo sequencial, com foco no mercado de trabalho. Com a decisão do STF, tirando os corporativistas, todos saíram ganhando a começar do leitor.”


E, para finalizar, busco inspiração na crônica de Barbara Gancia, “Jornalistas e cozinheiros”, Folha de 19 de junho: “Não é porque caiu a obrigatoriedade do diploma que a velha história sobre ter competência e se estabelecer deixou de vigorar. Por sorte, o trabalho do jornalista continua a ser uma vitrine em uma esquina movimentada: seu talento – ou a falta dele – será visto por todos os que passarem na frente da loja”.

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