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terça-feira, 24 de junho de 2025

O FUTEBOL DE RUA QUE O TEMPO LEVOU




              Guilherme Simões, jornalista, Santos (Brasil), 24 de junho de 2025


Em tempos de guerra, vale uma reflexão sobre os rumos da sociedade. O mundo evoluiu em muitos aspectos, principalmente na área tecnológica, mas ainda permanece refém de líderes inconsequentes. A luta pelo poder leva o planeta a um futuro incerto e sombrio, com ataques militares e trocas de ameaças entre as potências mundiais. Tudo pelo orgulho ferido. O “fim do mundo” voltou a ser pauta nas redes sociais.

Em agosto de 1999, jogava bola na rua com amigos em meio a boatos sobre o apocalipse. Eu não lembro exatamente o porquê (dos boatos), mas havia um temor generalizado por conta de um eclipse solar no dia 11 de agosto daquele ano. O assunto era discutido entre um intervalo e outro, mas ninguém levava tão a sério quanto o placar do jogo. A rua Roberto Sandall, em Santos, onde cresci, era conhecida por seus torneios esportivos - futebol e jogo de taco eram as modalidades mais praticadas por lá. Ninguém reclamava do calor, do asfalto ruim ou dos pés descalços.

A gente só lamentava mesmo quando algum carro tinha a AUDÁCIA de transitar pela via e interromper a partida. Mas não era comum. Naquela época, a quantidade de veículos era infinitamente inferior aos dias de hoje. Apenas os gritos de gol quebravam o silêncio e, às vezes, o retrovisor de algum carro estacionado. Arbitragem? Só atrapalharia. O futebol de rua sempre viveu bem sem juiz, embora quase sempre houvesse algum morador intruso para reclamar ou dar palpite, prejudicando o andamento do jogo. Uma espécie de VAR dos anos 90.

Jogar, eu jogava mal demais, mas era bom em observar e detectar talentos. Alguns colegas driblavam com muita facilidade, mas não vingaram no futebol, talvez por falta de oportunidade, talvez por falta de incentivo. O futebol brasileiro deixou de ser referência quando passou a valorizar mais a parte tática e o preparo físico do que a habilidade. Nas categorias de base, atacantes e meias são orientados a marcar, a preencher espaços. A criação ficou em segundo plano.

Alguns jogadores brasileiros ganham tanta massa muscular no futebol europeu que acabam perdendo atributos igualmente valiosos, como a velocidade e a agilidade. Vinicius Junior é um exemplo recente.

Infelizmente, a nova mobilidade urbana, a insegurança pública e a concorrência desleal com a tecnologia acabaram sufocando as brincadeiras de rua, incluindo o futebol. A bola não rola mais no asfalto como antes. Muros e portões surgiram para criar barreiras. Uma pena, porque ali tudo era mais simples e espontâneo.

No futebol profissional, até o vento contrário vira motivo para lamentação. Podemos citar o Mundial de Clubes como exemplo. Os europeus têm razão ao reclamar das altas temperaturas nos Estados Unidos e da sequência de jogos em fim de temporada? Podem até ter, mas há um exagero nas críticas.

Os clubes brasileiros sofrem a temporada inteirinha com calor excessivo, com viagens longas e com gramados péssimos, mas nem por isso utilizam tais argumentos como pretexto para justificar derrotas e fracassos. 

Quem merece elogios é Lamine Yamal, 17, o maior talento do futebol mundial atualmente. Yamal, de origem humilde, veio ao Brasil nos últimos dias a convite de Neymar. Vestindo a camisa da Seleção Brasileira, o atacante espanhol visitou a Rocinha, na Zona Sul do Rio de Janeiro, e jogou futebol com crianças em uma quadra da comunidade. Além de ter muito talento, Yamal não perdeu a sua essência - dentro e fora de campo.

Em meio ao caos, ainda presenciamos ações que renovam a fé na humanidade.

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2 comentários:

  1. Texto impecável (modéstia à parte), de autoria do meu filho. Emocionei-me bastante, sobretudo, com o parágrafo final, citando o exemplo do 'menino' Lamine Yamal, 17 anos, de origem humilde, o maior talento do futebol mundial, atualmente. Ele veio ao Brasil nos últimos dias a convite de Neymar, Vestindo a camisa da Seleção Brasileira, o atacante espanhol visitou a Rocinha, na Zona Sul do Rio de Janeiro, e jogou futebol com crianças em uma quadra da comunidade. Além de ter muito talento, Yamal não perdeu a sua essência - dentro e fora de campo. EM MEIO AO CAOS, AINDA PRESENCIAMOS AÇÕES QUE RENOVAM A FÉ NA HUMANIDADE.

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  2. Em junho de 2025, data de publicação deste artigo, o mundo se choca com a guerra entre Irã e Iraque.

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